terça-feira, 26 de maio de 2009

A primeira pedra

nem sempre
os vãos me cabem
às vezes rolo
fora da calha

carne de pescoço
que sou
fio de navalha
não me talha

cerco não me cerca
meu precurso
é incerto

meu telhado
é de vidro
e só por isso

atiço...

sou eu
quem atira
a primeira
pedra

Paulo Ednilson


amorTecido

NU em pêlo visto,
quando não apenas despido,
mas, quase reparido,
viria ao mundo
e ao mundo veria noutro menino.
se eu te fosse íntimo
como um vestido,
sobrepeles, um tecido de sentidos,
todo o ar tornaria-se gozo!
no sentido mais perigoso.

rodrigomebs.
http://frutafarta.blogspot.com

segunda-feira, 25 de maio de 2009











Esfinge

o amor
não é apenas um nome
que anda por sobre a pele
um dia falo letra por letra
no outro calo fome por fome
é que a pele do teu nome
consome a flor da minha pele

cravado espinho na chaga
como marca cicatriz
eu sou ator ela esfinge
clarisse/beatriz

assim vivemos cantando
fingindo que somos decentes
para esconder o sagrado
em nosso profanos segredos
se um dia falta coragem
a noite sobra do medo

na sombra da tatuagem
sinal enfim permanente
ficou pregando uma peça
em nosso passado presente

o nome tem seus mistérios
que se esconde sob panos
o sol é claro quando não chove
o sal é bom quando de leve
para adoçar desenganos
na língua na boca na neve

o mar que vai e vem
não tem volta
o amor é a coisa mais torta
que mora lá dentro de mim
teu céu da boca é a porta
onde o poema não tem fim



Gomes & Gumes

todo poema tem dois gomes
toda faca tem dois gumes
de um eu não digo os nomes
da outra não mostro os lumes
se um corta com palavras
a outra com corte mesmo
se um é produto da fala
a outra do ódio a esmo

todo poema tem dois gomes
toda faca tem dois gumes
e um amor cego nas asas
brilhante de vagalumes
se em um a linguagem é sacana
na outra o corte é estrume
todo poema tem dois gomes
toda faca tem dois gumes

se em um peixe é palavra
na outra o brilho é cardume
é fio estrela na lavra
mal cheiro vício costume
de um eu não digo os nomes
da outra não mostro os lumes

se em um a coisa é sagrada
ofício provindo das vísceras
na outra a fé é lacrada
hóstia servida nas missas
se em um é cebola cortada
aroma palavra carniça
na outra o ferro é tempero
fé cega – fome amolada
poema é só desespero



Memorial das Laranjeiras

o livro e tua pele de sombras
atravessa o túnel do tempo
com a tua carcaça sem alma

vejo teus olhos acesos
e sonho o nome do que vejo
verlaine talvez nos seguisse
parasse o trem no momento

santa úrsula e santa bárbara
dormem dentro da pedra
ao lado do palácio
bem perto do perigo

passeiam por trás das memórias

oxossi que nos proteja
por estes ossos de fedra
em cada prece que eu reze
para encantar as serpentes
para esquecer o que seja
na tua boca sem beijo

através de e-mails postados
no livro nosso infinito
do antes agora depois



Metade
para ferreira gullar


nordeste a parte
que me deste
não cabe em mim
de tão profunda

algaravia

rústica palavra
vanguarda e poesia
luta corporal
noite veloz
poema sujo

muitas vozes
barulhos
vertigem do meio dia
neo conreto
su real
formigueiro imaginário
implosão
girassol em mar azul

morte na flora
bananas podres na feira
do maranhão ao caos do rio

poema enterrado sub mundo
a flor o nojo
do cimento
ao jasmim

afiando a carNAvalha
para Eliakin Rufino


roberta agora só se for cainelli
bruna só se for polleto
tecido tem que ser a própria pele
que encobre a nudez do esqueleto


o beijo só se for ao vivo
e-mail só se for inteiro
decência no legislativo
carnaval:
a gente brinca em fevereiro


cocada agorasó se for de coco
paçoca de amendoim
cigarro só se for de palha
cacique só se for da mata
linguagem só tupiniquim


bala só se for de prata
água só se aguardente
tônica só se for com gin
estado só se for de surto
eleição só se for sem furto
brilho só no camarim


golaço só se for de letra
ronaldo só se for werneck
malandro só se mandarim
política só se for decente
partido só sem presidente
governo eu que mando em mim


batismo só se for de pia
congresso só de poesia
reinaldo pode ser valinho
inda melhor se for jardim



Artur Gomes








quarta-feira, 20 de maio de 2009




arte: leo gomes


Avyadores do Brazyl +
Reubes Pess +
Evolução da Espécie +
Artur Gomes +
Blogueiros Desocupados
&
Outros Baratos Afins
arte: fátima queiroz

Cabeça

Quando eu sofria dos nervos
não passava debaixo de fio elétrico,
tinha medo de chuva, de relâmpio,
nojo de certos bichos que eu não falo
pra não ter que lavar minha boca com cinza.

Qualquer casca de fruta eu apanhava.
Hoje que sarei tenho uma vida e tanto:
já seguro nos fios com a chave desligada
e lembrei de arrumar pra mim esta capa de plástico,
dia e noite eu não tiro, até durmo com ela.

Caso chova, tenho trabalho nenhum.
Casca, mesmo sendo de banana ou de manga,
eu não intervo, quem quiser que se cuide.
Abastam as placas de atenção! que eu escrevo
E ponho perto. Um bispo quando tem zelo
Apostólico, é uma coisa charmosa.

Não canso de explicar isso pro pastor
da minha diocese, mas ele não entende
e fica falando, “ minha filha, minha filha” ,
ele pensa que é woman´s lib, pensa
que a fé ta lá em cima e cá em baixo
é mau gosto só. É ruim, é ruim
ninguém entende. Gritava até parar,
quando eu sofria dos nervos.

Adélia Prado



Pele

Um favo de mel na boca
um torrão de sal na anca
roubam para a pele
o calor de animais
simples e vorazes soltos
como numa catedral

pele de asno
pele de mel
pele de água

Olga Savary


Dúvida

Estou cego a todas as músicas
Não ouvi mais o cantar da musa.
A dúvida cobriu a minha vida
como o peito que me cobre a blusa.
Já a minha nenhuma cena soa
Nem o céu se me dasabotoa.
A dúvida cobriu a minha vida
Como a língua cobre a saliva
Cada dente que sai da gengiva.
A dúvida cobriu a minha vida
Como o sangue cobre a carne crua,
Como a pele cobre a carne viva
Como a roupa cobre a pele nua.
Estou cego a todas as músicas
E se eu canto é como um som que sua.

Arnaldo Antunes


Câmera Indiscreta

olho o olho que me olha
olho o olho
olho a lua
o olho que me olha olha mas não vê

olho o olho que me olha
olho a rua a lua a rua a rua a rua
eu atravesso a rua
o olho que me olha olha mas não sabe o quê

olho o olho no espelho
olho de loba
o olho que me olha olha mas não lê

vou olhando olho a olho corpo a corpo
olho ilhas
olho dentro de você

Ademir Assunção


Anímico

Nasceu no meu jardim um pé de mato
que dá flor amarela.
Toda manhã vou lá pra escutar a zoeira
da insetaria na festa.
Tem zoado de todo jeito:
tem do grosso, do fino, de aprendiz e de mestre.
é pata, é asa, é boca, é bico,
é grão de poeira e pólen na fogueira do sol.
parece que a arvorinha conversa.

Adélia Prado


Improviso

nuvens
são
cambraias

pétalas
tuas
faces

brisa
que farfalha
nas varandas
altas

cristalina
orvalho
diamantes
de água

se não posso
vê-la
nos píncaros
de jade

sob a lua
ei-la
no pavilhão
de jaspe

Haroldo de Campos


Frei Tito

Frei Tito de Alencar Lima
foi preso em novembro de 1969, acusado de oferecer infra-estrutura a Carlos Marighela, Tito é submetido a palmatória e choques elétricos, no Deops, em companhia de seus confrades. Em fevereiro do ano seguinte, quando já se encontra em mãos da Justiça Militar, é retirado do presídio Tiradentes e levado para a Operação Bandeirantes, mas tarde conhecida como DOI-Codi, à rua Tutóia.
Durante três dias, batem sua cabeça na parede, queimam sua pele com brasa de cigarros e dão-lhe choques por todo o corpo, em espeical na boca "para receber a hóstia" , gritam os algozes. Fernando Gabeira preso ao lado tudo percebe. Querem que Tito denuncie quem o ajnudou a conseguir o sítio de Ibiúna para o Congresso da UNE (União Nacional dos Estudantes) em 1968, e assine depoimento atestando que dominicanos participaram de assaltos a bancos.
No limite da sua resistência, Tito corta com gilete que lhe emprestaram para fazer a barba, a artéria interna do cotovelo esquerdo. É socorrido a tempo no hospital militar, do Cambuci. As incessantes torturas não abrem a boca do frade de 28 anos, mas lhe cindem a alma. Cumpre-se a profecia do capitão Albernaz, da Oban: "Se não falar, será quebrado por dentro , pois sabemos fazer as coisas sem deixar marcas vísiveis. Se sobreviver, jamais esquecerá o preço da valentia" .
Em dezembro de 1970, incluído na lista de presos políticos trocados pelo embaixador suíço Giovane Bucher, sequestrado pela VPR de Lamarca, Tito é banido do Brasil pelo governo Médici.
De Santiago do Chile ruma para Paris, sem jamais recuperar sua harmonia interior. Nas ruas da capitão francesa ele "vê" o espectro de seus toruradores. ...contorce-se em calafrios sob o fantasma o delegado Fleury. Sua mente naufraga em delírios. No dia 10 de agosto de 1974, um estranho silêncio paira sob o céu azul do verão francês, envolvendo folhas, ventos, flores e pássaros. Nada se move. Entre o Céu e a Terra, sob a copa de um álamo, balança o corpo de Frei Tito dependurado numa corda.
Do outro lado da vida ele encontrara a uidade perdida. Deixa registrado em seus papéis que "é melhor morrer do que perder a vida".

Frei Betto

Refrão à Moda de Brecht

contra
o bloqueio de
cuba
mas também
contra
a contumácia “dinossáurea”
de-mário soares “dixit” -
fidel

contra o bombardeio do
golfo
(guerra de mísseis teleterríveis
sob as estrelas pasmas de nínive)
mas também
contra
a empáfia loucoloquente de
sadam hussein

contra
o fundo monetário
internacional fundo
usuário
no interno mais profundo
de geryon (dante, inferno)
mas também

contra
a corrupção voraginosa de
/burocratas e políticos
(políticos venais
/mandarins-tecnocratas
de colarinho branco
assentados sobre nádegas ociosas)
brasileiros

contra
os ensandecidos xiitas
palestinos
mas também
contra
a surdez míope dos judeus
fundamentalistas

ó favônio
vento que favorece
divino na rosa-
-rosa dos ventos-
quando poderemos
ser inteiramente
a favor?

Haroldo de Campos
Çaiçuçáua*

sempre o verão
e algum inverno
nesta cidade sem outono
e pouca primavera

tudo isto te vê entrar
em mim todo inteiro
e eu em fogo vou bebendo
todos os teus rios

com uma insaciável sede
que te segue às estações
no dia aceso

em tua água sim está meu tempo
meu começo. E depois nem poder ordenar:
te acalma, minha paixão

*(do tupi): amor, amado

Olga Savary
Todos estes poemas foram musicados e magistralmente interpretados por Madan, em seu CD de estréia em 1997.

Sutilezas & Sortilégios de Madan
Haroldo de Campos

Madan, algo de mágica e dança no nome emblema, canta, compõe, violoniza. Intervém, com timbre próprio e dom peculiar, no canoro diálogo poema (letra)/canção: canoro, lírico, mas também satírico, na boa tradição dos cancioneiros d´amor trovadorescos e das medievais(desabusadas) cantigas d´escárnio e mal-dizer. Posso dar testemunho (antes de mais nada) quanto aos textos meus que musicou e que canta. Tramou habilmente minhas palavras em seus sons pontilhistas, claros, raros (como no Li T´ai Pó – improviso – poema que “transcriei” a partir do original chinês); soube, também, urdí-las, cáusticas, ouriçadas, paródicas, irônicas, no seu violoneio engajado, quando teve de lidar com textos como o combinatório “Mundo (Mindo) Livre (Luvre)”, destabocado e derrisório ou o brechtiniano/horaiciano “refrão à maneira de”. Palmas e salvas para ele, Madan, com suas mágicas de voz violonada e suas danças de letra-voz.som.


Madan tem um incrível talento para transformar poemas em canções. As palavras fluem fáceis, nada forçado. Com sua sensibilidade especial, consegue descobrir a sonoridade e o ritmo dos versos, vestindo-os com melodias ora doces, ora melancólicas. Som, palavra e voz se harmonizam neste CD repleto de belezas. Um presente para os ouvidos sensíveis.

Ademir Assunção







Goytacá Boy

ando por são Paulo meio Araraquara
a pele índia do meu corpo
concha de sangue em tua veia
sangrada ao sol na carne clara

juntei meu goytacá teu guarani
tupy or not tupy
não foi a língua que ouvi
em tua boca cayçara

para falar para lamber
para lembrar
da sua língua arco íris litoral
como colar de uiara
é que eu choco como a chuva curuminha
mineral da mais profunda lágrima
que mãe chorara

para roçar para provar para tocar
na sua pele urucun de carne e osso
a minha língua tara
sonha cumer do teu almoço
e ainda como um doido curuminha
a lamber o chão que restou da Guanabara


Matéria Prima

gosto da lenda dos poemas nas correntes
densas madrugadas de costuras artesanato
porque não canto quando calo ou quando cato

porque não canto o que cito quando planto
matéria prima das sementes quando fatos
talvez a trilha do silêncio das serpentes
talvez a fonte das nascentes nos regatos

toda pérola tem um P no seu início
palavra que concentro quando perto
da porta do teu nome ou do teu parto
mesmo grávida sem nunca ter parido
emsmo virgem sem nunca ter amado
toda pérola tem um P do seu marido

todo homem tem um Q no seu princípio
um poema como toque concentrado
travessia como roupa pelo avesso
aviso que concentro no meu ritmo
de insana criatura sem começo
toda Moça tem um homem no seu íntimo
de múltiplas residências endereços


SampleAndo

o poema pode ser
um beijo em tua boca
carne de maçã em maio
um tiro oculto sob o céu aberto
estrelas de neon em vênus
refletindo pregos
no meu peito em cruz

na paulista consolação
na água branca barra funda
metal de prata
desta lua que me inunda
num beijo sujo
com a Estação da Luz

nos vídeos/filmes de TV
eu quero um clipe
nos teus seios quentes
uma cilada em tuas coxas japa
como uma flecha
em tuas costas índia
ninja gueixa
eu quero a rota teu país ou mapa

teu território devastar inteiro
como uma vela ao mar de fevereiro
molhar teu cio
e me esquecer da lapa.


terça-feira, 19 de maio de 2009



Sonho tenaz


Ao escritor chileno Roberto Bolaño in memoriam


Um diário descontínuo
que abre e fecha
com uma orquestra que acompanha

poesia
vertiginosa e sincopada
comovedor
romântico
Rimbaud em fuga perpétua


E já sabes como és
Cesaré a disse uma vez
para além do ano 2600
queimando as mãos e os pés
por cada poema
exalado

O que há por detrás?


Temor

“La mejor parte es sentirse vivo pintando y la peor es necesitar hacer pinturas para sentirse vivo”Geoffrey Lawrence


Reverência emocionada
quando tudo
deixa
de
importar
quando tudo está escuro
quando tudo está perdido

Que a musa te toque com seus
dedos as costa
se te empurre ao caminho


Que a frieza das cidades
que a rosa do nada
que a lama imóvel
que a areia movediça do deserto
não apaguem a tristeza da tinta
que há de alcançar a água

E seja ar movido por lábios
uma
vez
mais

Leo Lobos
tradução para o português:
GERUZA ZELNYS DE ALMEIDA


domingo, 17 de maio de 2009



Blog And Roll & Poesia
e Outros Baratos Afins

Dia – 26 Maio – Das 19 às 23:00hs
Local – Bar Fórmula 1 – Av. Alberto Torres,
Logo depois do Sesc – Campos dos Goytacazes-RJ

Trilhos Urbanos –
Oficina Cine Vídeo Fotografia
http://www.youtube.com/watch?v=gASgVQScsDk&feature=channel_page

Cultura Urbana Sesc Campos

Mostra de Curtas Produzidos na Oficina Cine
Vídeo Fotografia e bate papo com o poeta,
produtor e vídeo maker Artur Gomes

Dias, 28, 29 30 e 31 Maio – 15:00 hs

Nação Goytacá
FULINÍMA PRODUÇÕES:
http://youtube.com/fulinaima

sagarânica

desejar-te
é uma arte
que cultivo
planta
quando canta
ou cala
quando fala
ou ri

desejar-te
é uma parte
que de mim
re-parte
para
ti

arturgomes



foto:
beatriz
bajo











quero escrever o borrão vermelho de sangue
com as gotas e coágulos pingando
de dentro para dentro.
quero escrever amarelo-ouro
com raios de translucidez.
que não me entendam pouco-se-me-dá.

nada tenho a perder.
jogo tudo na violência
que sempre me povoou,
o grito áspero e agudo e prolongado,
o grito que eu, por falso respeito humano,
não dei.
mas aqui vai o meu berro
me rasgando as profundas entranhas
de onde brota o estertor ambicionado.
quero abarcar o mundo
com o terremoto causado pelo grito.

o clímax de minha vida será a morte.
quero escrever noções
sem o uso abusivo da palavra.
só me resta ficar nua:
nada tenho mais a perder.

vermelho de sangue – Lispector




ao nascer do azul



eternoé o belo
que ao amanhecer
falece



delicado
e sem doer.


na cordo sol materno
amar é elo
em outro ser,


um seio
em flor
entre o azul
e o porquê.



rodrigo mebs.



RELICÁRIO

Vêque a manhã infinda
ainda ressoa por sobre
minhas sandálias

E ainda que tardio
volto ao cais
onde vivi

Como um iniciante
que ao primeiro olhar
distribui risos e silêncios

E
ao sol que se põe
sou mais um que adormece
por entre flores e canções.

Cgurgel
eu queria tanto
ser um poeta maldito
a massa sofrendo
enquanto eu profundo medito

eu queria tanto
ser um poeta social
rosto queimado
pelo hálito das multidões
em vez
olha eu aqui
pondo sal
nesta sopa rala
que mal vai dar para dois.

de ouvido
di vidi do
entre
o
ver
&
o
vidro
du vi do.

sim
eu quis a prosa
essa deusa
só diz besteiras
fala das coisas
como se novas

não quis a prosa
apenas a idéia
uma idéia de prosa
em esperma de trova
um gozo
uma gosma

uma poesia porosa.

coração
PRA CIMA
escrito em baixo
FRÁGIL.

nada que o sol
não explique
tudo que a lua
mais chique

não tem chuva
que desbote essa flor

paulo leminski
OFÍCIO

Quiz fazer da poesia
a minha arte.
A tudo supliquei conhecimento;

Dos ventos
quiz saber da liberdade.
Das tardes
quiz saber do esquecimento.

Saí batendo por aí
de porta-em-porta.

Pois cada gota de conhecimento
me dá a sensaçãode ter luz própria.

Zeca Tocantins




extremo

caminho na direção
do amanhecer

ainda que anoiteça

como nascente
dum rio digital

fragilidade insensata
no universo absoluto

perenidade que se
perde na memória

sem medo detransbordar

Lau Siqueira-poema em construção


Todo Amor que Houver Nessa Vida

Eu quero a sorte de um amor tranqüilo
Com sabor de fruta mordida
Nós na batida, no embalo da rede
Matando a sede na saliva
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum trocado pra dar garantia

E ser artista no nosso convívio
Pelo inferno e céu de todo dia
Pra poesia que a gente não vive
Transformar o tédio em melodia
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum veneno antimonotonia

E se eu achar a tua fonte escondida
Te alcanço em cheio, o mel e a ferida
E o corpo inteiro como um furacão
Boca, nuca, mão e a tua mente não
Ser teu pão, ser tua comida
Todo amor que houver nessa vida
E algum remédio que me dê alegria

Frejat/ Cazuza

quinta-feira, 14 de maio de 2009


Poesia

eu te penetro
em, nome o do pai
do filho
do espírito santo
amém

não te prometo
em nome
de ninguém


Unplugged

quero botar no seu orkut
um negócio sem vergonha
um poema descarado
tá chegando fevereiro
e meu rio de janeiro
fica lindo e mascarado
quero botar no seu e-mail
um negócio por inteiro
eu não sou Zeca Baleiro
pra ficar cantando a mama
que ainda tem medo do papa
meu negócio é só com a mina
que me trampa quando trapa
meu negócio é só com a mina
que me canta ouvindo o Rappa


Pátri(A)mada

sóme queira assim caçado
mestiço vadio latino
leão feroz cão danado
perturbando o teu destino

só me queira enfeitiçado
veloz macio felino
em pêlo nu depravado
em tua cama sol a pino

só me queira encapetado
profanando àqueles hinos
malando moleque safado
depravando os teus meninos

só me queira desalmado
cão algoz e assassino
dupramente descarado
quando escrevo e não assino

Artur Gomes
in suor & cio - in couro cru & carne viva


O Coisa Ruim

me querem manso
cordeiro
sangrado
no festim dos canibais

me querem
otário
serviçal
salário apertado no bolso
cego mudo boçal

me querem acuado
rabo entre as pernas
medroso
um verme
pegajoso

ma seu sou
osso duro de roer
caroço
faca no pescoço
maremoto
tufão
furacão
mas eu sou cão
ladro mordo
ínsito a revolta deuses
toco fogo na cidade

qual Nero
devasto o lero lero
entro em campo
desempato

eu sou o que sangra
um poeta nato

Ademir Assunção

http://zonabranca.blog.uol.com.br

quarta-feira, 13 de maio de 2009



Dor Elegante

Paulo Leminsk

um homem com uma dor
e muito mais elegante
caminha mesmo de lado
como se chegando atrasado
chegasse mais adiante

carrega o peso da dor
como se portasse medalhas
uma coroa, um milhão de dólares
ou coisa que os valha

ópios, éden analgésicos
não me toquem nessa dor
ela é tudo o que me sobra
sofrer vai ser a minha última obra
quando eu vi você
tive uma idéia brilhante
foi como se eu olhasse
de dentro de um diamante
e meu olho ganhasse mil faces
num só instante
basta um instante
e você tem amor bastante
um bom poema
leva anos
cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
uma eternidade,
eu e você,
caminhando junto
ali
ali
se
se alice
ali se visse
quanto alice
viu e não disse
se ali ali se dissesse
quanta palavra
veio e não desce
ali
bem ali
dentro da alice
só alice
com alice
ali se parece
eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro do meu centro
este poema me olha
isso de querer
ser exatamente
aquilo que a gente é
ainda vai nos levar além
(in "Distraído Venceremos" Ed. Brasiliense, 1987)

1.
lembrem de mim
como de um que
ouvia a chuva
como quem assiste missa
como quem hesita, mestiça,
entre a pressa e a preguiça
2.
já me matei
faz muito tempo
me matei quando o tempo era escasso
e o que havia entre o tempo e o espaço
era o de sempre
nunca mesmo o sempre passo
morrer faz bem à vista
e ao baço melhora o ritmo do pulso
e clareia a alma
morrer de vez em quando
é a única coisa que me acalma
Quem nunca viu que a flor,
a faca e a fera
tanto fez como tanto faz,
e a forte flor que a faca faz
na fraca carne, um pouco menos,
um pouco mais,
quem nunca viu a ternura
que vai no fio da lâmina samurai,
esse, nunca vai ser capaz.
Paulo Leminski
1944, Curitiba, Paraná, 24 de agosto, nascimento de Paulo Leminski Filho. Filho de Paulo Leminski e Áurea Pereira Mendes Leminski
1964, São Paulo, SP, publicação de poemas na revista Invenção, porta voz da poesia concreta paulista.
1968, casamento com a poeta Alice Ruiz.
Filhos: Miguel Ângelo, falecido aos 10 anos; Áurea Alice e Estrela.
1970/1989, Curitiba, Paraná, redator de publicidade.
Músico e letrista. Canções gravadas por Caetano, A Cor do Som.
1975, Curitiba, PR, publicação de Catatau, um romance experimental.
1980/1986, São Paulo, colaborador do suplemento Folhetim, do jornal Folha de São Paulo; também colaborador da revista Veja.
1984/1986, Curitiba, PR, tradutor de Alfred Jarry, James Joyce, John Fante, John Lennon, Samuel Becktett e Yukio Mishima
1986, São Paulo, SP, publicação do livro infanto-juvenil Guerra dentro da gente.
1989 – Curitiba, PR, 07 de junho: morte.
Paulo Leminski foi um estudioso da língua e cultura japonesas e publicou em 1983 uma biografia de Bashô. Sua obra tem exercido marcante influência em todos os movimentos poéticos dos últimos 20 anos.










Cogito


Torquato Neto


eu sou como eu sou
pronome
pessoal intransferível
do homem que iniciei
na medida do impossível
eu sou como eu sou
agora
sem grandes segredos dantes
sem novos secretos dentes
nesta hora

eu sou como eu sou
presente
desferrolhado indecente
feito um pedaço de mim

eu sou como eu sou
vidente
e vivo tranqüilamente
todas as horas do fim.

Torquato Pereira de Araújo Neto nasceu em Teresina (PI), no dia 09 de novembro de 1944. Foi contemporâneo de Gilberto Gil no colégio em que estudou, em Salvador, tornando-se amigo do compositor e conhecendo também os irmãos Caetano Veloso e Maria Bethânia. Em 1966 mudou-se para o Rio de Janeiro, começando seus estudos de Jornalismo. Mesmo sem ter concluído o curso, iniciou-se na profissão trabalhando em diversos jornais cariocas, tendo criado e redigido a coluna "Geleia Geral" no jornal carioca "Última Hora".

Um dos criadores do movimento tropicalista, é o autor de inúmeras letras de músicas de sucesso, entre as quais destacamos "Mamãe, Coragem", "Geléia Geral", "Domingou", "Louvação", "Pra dizer adeus", "Rancho da rosa encarnada" e "Marginália II". Em 10 de novembro de 1972, suicidou-se deixando o seguinte bilhete:

"Tenho saudade, como os cariocas, do dia em que sentia e achava que era dia de cego. De modo que fico sossegado por aqui mesmo, enquanto durar. Pra mim, chega! Não sacudam demais o Thiago, que ele pode acordar".

Em 1973, ocorreu a publicação póstuma de seu livro "Os Últimos Dias de Paupéria", organizado por Ana Maria Silva Duarte e Waly Salomão. Três anos depois, alguns de seus poemas foram incluídos na antologia "26 Poetas Hoje", organizada por Heloísa Buarque de Hollanda. Em 1997, foram publicados quatro de seus poemas na antologia bilíngüe "Nothing the Sun Could Not Explain", organizada por Michael Palmer, Régis Bonvicino e Nelson Ascher.
O poema acima foi publicado no livro "Os Últimos Dias de Paupéria", Max Limonad - Rio de Janeiro, 1973, e selecionado por Ítalo Moriconi para figurar no livro "Os cem melhores poemas brasileiros do século", Objetiva - Rio de Janeiro, 2001, pág. 269.