segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Horizonte NU


 Aqui o litoral seduz o corpo,
a água esconde um mar de sêmen
e a espuma lambe os pés com língua de sal.

Soubesse antes do horizonte nu,
teria me inaugurado na linha do oceano,
jamais entre as paredes de uma casa.

Casas degolam liberdades.
Mas ao vento marítimo todos os rumos são possíveis:
as algas ensinam caminhos múltiplos
aos passos indecisos do pensamento.

Soubesse antes da solidão atlântica,
o mofo dos dias submergia nela
e a inquietude urbana viria para um banho de sol,
deixando vazias as ruas e as pessoas.
Ruas têm sempre esquinas
e pessoas sempre se impõem limites:
ambas não conhecem o dialeto infinito da distância.

Aqui, junto às ondas, se decifra o idioma dos náufragos.
Porque apenas vozes afundadas no desconhecido
narram como claridade a vida.

Lá atrás fica o fim do horizonte,
existe um cardume perdido com roupas sobre a pele.
Lá está a resposta que o sangue vomita.
Há mais casas que céu, mais poeira que gotas
E um chão sem areia morna nem cheiro de maresia.

Nesse lugar, o futuro é um peixe nascido sem nadadeiras.

Sérgio Bernardo – Nova Friburgo - RJ

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

trem da consciência


Trem da Consciência

Não espere que eu fale só de estrelas
Ou do vinho feliz
Que eu não tomei
Porque
Fora de mim
Não levo além da sombra
Uma camisa velha
E dentro do peito
Um balde de canções
Uma gota de amor
No útero de uma abelha
Não repare se eu não frequento o clube
Dos que sugam o sangue das ovelhas
Ou amargam o mel
Dessa colméia
É que eu já vivo
Tão pimenta
Tão petróleo
Que se você acende os olhos
Me incendeia
Hoje em dia
Pra gente amar de vera
É preciso ser quase
Um alquimista
Ou talvez o maquinista
Do trem da consciência
Pra te amar com tanta calma
E com tanta violência
Que a tua alma fique
Toda ensanguentada
De vivência

Poema de Salgado Maranhão musicado por Vital Lima e cantado por Zeca Baleiro, no vídeo Érica Ferri filmado por Artur Gomes em Bento Gonçalves.

Artur Gomes
poeta.ator.vídeo.maker
Fulinaíma Produções
 (22)9815-1266


quarta-feira, 14 de setembro de 2011

jazz free som balaio


 ouvidos negros Miles
trumpete nos tímpanos
era uma criança forte
como uma bola de gude
era uma criança mole
como uma gosma de grude
tanto faz quem tanto não me fez
era uma ant/versão de blues
nalguma nigth noite uma só vez
ouvidos brack rumo premeditando o breque
Sampa midinigth ou aversão de Brooklin
não pense aliterações em doses múltiplas
pense sinfonia em rimas raras
assim quando despertas do massificado
ouvidos vais ficando dançarina cara
ao ter-te arte nobre minha musa Odara
ao toque dos tambores ecos sub/urbanos
elétricos negróides urbanóides gente 
galáxias relances luzes sumos pratos
delícias de iguarias que algum deus consente
aos gênios dos infernos que ardem arte
misturas de comboios das tribos mais distantes
de múltiplas metades juntas numa parte


Artur Gomes
poeta.ator.vídeo.maker
Fulinaíma Produções
 (22)9815-1266

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

boca do inferno



injúria secreta


suassuna no teu corpo
couro de cor compadecida
ariano sábio e louco
inaugura em mim a vida

pedra de reino no riacho
gumes de atalhos na pedreira
menina dos brincos de pérola
palavra acesa na fogueira

pós os ismos tudo é pós
na pele ou nas aranhas
na carne ou nos lençóis
no palco ou no cinema
o que procuro nas palavras
é clara quando não é gema

até furar os meus olhos
com alguma cascata de luz
devassa em mim quando transcende
lamparina que acende
e transforma em mel o que antes era pus


arturgomes
http://pelegrafia.blogspot.com

obs.: do livro inédito Juras Secretas, este poema será lançado na Antologia Poetas do Brasil – volume 13 na semana de 3 a 8 de outubro d 2011 na programação do XIX Congresso Brasileiro de Poesia, em Bento Gonçalves-RS

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

e por falar em trabalho escravo


Tecidos sobre a pele

Terra,
antes que alguém morra
escrevo prevendo a morte
arriscando a vida
antes que seja tarde
e que a língua
da minha boca
não cubra mais tua ferida

entre/aberto
em teus ofícios
é que meu peito de poeta
sangra ao corte das navalhas
e minha veia mais aberta
é mais um rio que se espalha

amada de muitos sonhos
e pouco sexo
deposito a minha boca no teu cio
e uma semente fértil
nos teus seios como um rio
o que me dói é ter-te
devorada por estranhos olhos
e deter impulsos por fidelidade

ó terra incestuosa
de prazer e gestos
não me prendo ao laço
dos teus comandantes
só me enterro à fundo
nos teus vagabundos
com um prazer de fera
e um punhal de amante

minha terra
é de senzalas tantas
enterra em ti
milhões de outras esperanças
soterra em teus grilhões
a voz que tenta – avança
plantada em ti
como canavial que a foice corta
mas cravado em ti
me ponho a luta
mesmo sabendo  - o vão
estreito em cada porta

usina
mói a cana
o caldo e o bagaço
usina
mói o braço
a carne o osso
usina
mói o sangue
a fruta e o caroço
tritura suga      torce
dos pés até o pescoço

e do alto da casa grande
os donos do engenho controlam
: o saldo e o lucro


arturgomes

obs.: publicado originalmente em 1985 no livro Suor & Cio este poema será lançado na Antologia Poetas do Brasil – volume 13 na semana de 3 a 8 de outubro dentro da programação do XIX Congresso Brasileiro de Poesia

sábado, 3 de setembro de 2011

tropicalha


vendo
a lua leviana
no império das bananas
papagaios piriquitos graviola

a fruta eu chupo morena
semente eu planto cigana
na selva pernambucana
nossa língua deita e rola

arturgomes