segunda-feira, 22 de junho de 2009




césar castro - wermmer além da alma - transpirações gráficas





Mar de Búzios

vaza sob meus pés
um rio das ostras
enquanto minha mãos em conchas
passeiam o mangue dos teus seios
e provocam o fluxo do teu sangue
os caranguejos olham admirados
a volúpia dos teus cios
quando me entregas o que traz
por entre as praias e permites desatar
todos os nós do teu umbigo
transbordando mar de búzios
- oceanos
atrlântico pulsar entre dois corpos
que se descobrem peixes
e mergulham profundezas
qualquer que seja a hora
em que se beijam num pontal
em comunhão total com a natureza


A luz do meio-dia, transparente,
filtrava pelas paralelas bordas
da janela, e o confronto em fulgor das
frutas (ou da tua pele?) ardia quente.
Saudade é o que o torpor do sono senteda ilha.
Aquele céu (não te recordas?)
de acaso que no opaco véu põe gordas
camadas cambiantes de poente,
um outro brilho tinha. Onde eu dormia,
numa casinha litorânea e pobre,
no ar a luz das lâmpadas de cobre,
traçava lentamente espirais sobre
alva toalha, sombra em que se urdia
o teorema doutra geometria.


Amor é fogo que arde sem se ver
É ferida que dói e não se sente
É um contentamento descontente
É dor que desatina sem doer
É um não querer, mais do que bem querer
É solitário andar por entre a gente
É nunca contentar-se de contente
É cuidar que se ganha em se perder
É querer estar preso por vontade
É servir a quem vence, o vencedor
É ter com quem nos mata lealdade
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade
Se tão contrário a si é o mesmo amor?

Luis de Camões


Leminski Ana 9
para Marisa Francisco

o estado pode ser de choque
ou quem sabe até de surto
o soco pode ser no estômago
a facada for ferir o fígado
o bandido me assaltar na via
o sangue explodir na veia
a vodka só me der asia
todo instante que vier eu curto
a palavra que pintar eu furto
tudo o que eu faço é poesia.

artur gomes


Ney Matogrosso/Pedro Luis


Corre calma Severina noite
De leve no lençol que te tateia a pele fina
Pedras sonhando pó na mina
Pedras sonhando com britadeiras
Cada ser tem sonhos a sua maneira
Cada ser tem sonhos a sua maneira


Corre alta Severina noite
No ronco da cidade uma janela assim acesa
Eu respiro seu desejo
Chama no pavio da lamparina
Sombra no lençol que tateia a pele fina
Sombra no lençol que tateia a pele fina

Ali tão sempre perto e não me vendo
Ali sinto tua alma flutuar do corpo
Teus olhos se movendo sem se abrir
Ali tão certo e justo e só te sendo
Absinto-me de ti, mas sempre vivo
Meus olhos te movendo sem te abrir


Corre solta suassuna noite
Tocaia de animal que acompanha sua presa
Escravo da sua beleza
Daqui a pouco o dia vai querer raiar


sagarânica ou fulinaímica

jogo de dada/ista
não sou iluminista/nem pretender
eu quero o cravo e a rosa
cumer o verso e a prosa
amanhecer nova poética
devorar a lírica a métrica
canibalizar a carne da musa
seja branca/negra
amar/ela vermelha verde
ou cafusa
eu sou do mato curupira carrapato
eu sou da febre sou dos ossos
sou da lira do delírio
e virgílio é o meu sócio
pernambuco amaralina
vida leve ou sempre/vida severina
sendo mulher ou só menina
que sendo santa prostituta
ou cafetina
devorar é minha sina
profanar
é o meu negócio

artur gomes


O sentido normal das palavras não faz bem ao poema. Há que se dar um gosto incasto aos termos. Haver com eles um relacionamento voluptuoso. Talvez corrompê-los até a quimera. Escurecer as relações entre os termos em vez de aclará-los. Não existir mais rei nem regências. Uma certa liberdade com a luxúria convém.


lindo, não é, Artur? parece contigo isso

Michèlle Sato


Bia de Dante 2

...e quanto mais ela sorrisse
eu entendia o que disse
:
me ame dentro dos olhos
e nunca mais ame a clarice
me venha com tuas juras
tuas taradas loucuras
teu amor antropofágico
me ame quando for lírico
me ame quando for trágico

sou beatriz e espero
por estes séculos afora
quem venha e me deflora
me liberte dos tecidos
quem me livre dos vestidos
me abra portas/janelas
me cansei destas esperas
decidida me entrego
a ti poeta das bocas dos infernos

sou razão dos teus delírios
e dos teus versos profanos
me livre de todos os panos
me prove do amor eterno

Artur Gomes


Artur. Você é umas das mais bonitas provas do quanto a virtualidade é o mais concreto dos mundos. O que me tocou quando te conheci foi a sua forma de ressignificar as palavras. Cansada de ler “batatinhas quando nascem”, sempre desejei alguma coisa nova... Alguma criação revolucionária que pudesse sair da mesmice, que pudesse mudar a vida, reinventando a paixão. Suas palavras enlouquecem verbos, deliram na musicalidade de quem ama e deve também fazer estragos aos quadradinhos que querem rotular tudo numa corrente literária, sem compreender as energias que transcendem escolas. Dizer que admiro você, frente a este contexto, parece pouco:

EU DELIRO POR VOCÊ!!!!





,furai
a pele das partículas dos poemas
viemos das gerações neoabstratas
assistindo a belos filmes de Godart
inertes em películas de Truffaut
bebendo apocalipses de Fellinie
em tropicâncer genocidas de terror

,sangrai a tela realista dos cinemas
na pele experimental do caos urbano,
tragaiDali pele entre/ossos
Glauber rugindo enTridentes
na língua do veneno o gozo das serpentes
nos frascos insensíveis de isopor

,caímos no poder do vil orgânico
entramos no curral dos artefatos
na porta de entrada os artifícios
na jaula sem saída os mesmos pratos


Detrito Federal

profano as tetas da vaca
e dou descarga na coisa privada
para limpar a coisa pública
estou aqui na república
império das empreiteiras
navios bancos fantasmas
laranjas vampiros de fato
dos esgotos surgem os ratos
nos palácios senados congressos
poeta não é o bobo da corte
poeta é pedra no sapato
governabilidade é o cacete
política não é só panfletagem
um país não é só a sacanagem
que se varre para baixo do tapete

arturgomes



ouvidos negros Miles trumpete nos tímpanos
era uma criança forte como uma bola de gude
era uma criança mole como uma gosma de grude
tanto faz quem tanto não me fez
era uma ant/versão de blues
nalguma night noite uma só vez

ouvidos black rumo premeditando o breque
sampa midinight ou aversão de broklin
não pense aliterações em doses múltiplas
pense sinfonia em rimas raras
assim quando desperta do massificado
ouvidos vais ficando dançarina cara
ao ter-te arte nobre minha musa Odara

ao toque dos tambores ecos sub/urbanos
elétricos negróides urbanóides gente
galáxias relances luzes sumos pratos
delícias de iguarias que algum Deus consente
aos gênios dos infernos que ardem gemem arte
misturas de comboios das tribos mais distantes
de múltiplas metades juntas numa parte

arturgomes


Metáfora

cavalo passo em tua janela e sem rédeas arreios ou celas alazão que sou de selvagens pradarias lagarto a soltar a pele depois de 40 dias me verão eu tigre expulso das jaulas farejando a caça pelos becos das tardes onde estão os alucinados da cidade enquanto ardendo ao sol a carne do meu corpo de estrelas cadentes e luas menstruadas despeja sobre teus olhos uma enchurrada de palavras como as cachoeiras que ainda não conheces e delas ainda não provou do líquido que teima em escorrer entre as tuas coxas onde minha língua há de beber um dia em que os sentidos me despertem e eu vá colher os lírios dos teus pântanos.

Artur Gomes
olho de lince

onde engendro
a sagarana

invento
a sagaranagem

entre a vertigem
e a voragem

na palavra
de origem

entre a língua
e a miragem


mordendo: o vírus da linguagem
no olho de lince do poema

Artur Gomes

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