sexta-feira, 10 de setembro de 2010

do silêncio dos poetas

arturgomes - http://collagensfulinaimicas.blogspot.com/








o poema
recolhe-se
a escuridão
das frestas
enquanto
palavras perambulam
pela cerâmica fria
despedaçam-se
contra a louça suja
acumulada na pia
nem Beethoven
e sua 7ª. sinfonia
nem a eternidade
e sua
falsa homilia
apenas palavras
e silêncio
velas sem ventania
entregues ao sabor
da calmaria
palavras sem morada ou teto
sem significado abstrato
ou concreto
traídas no horto
sedentas de rumo
saudosas de porto
em busca de um poema
seja qual for a métrica
ou o tema
não precisa
ser elegia ou soneto
eu juro
eu prometo
pode ser
em verso livre
como a poesia que vive
na mansão e na rua
pode falar do sol
pode falar da lua
da minha dor
ou da tua
não precisa
ser poema chique
quero apenas
que chegue e fique

Fernando Freire
Samambaia, 05.09.2010




Canção Amiga

Eu preparo uma canção
em que minha mãe se reconheça,
Todas as mães se reconheçam,
e que fale como dois olhos.

Caminho por uma rua
que passa em muitos países.
Se não me vêem, eu vejo
e saúdo velhos amigos.

Eu distribuo um segredo
como quem ama ou sorri.
No jeito mais natural
dois carinhos se procuram.

Minha vida, nossas vidas
formam um só diamante.
Aprendi novas palavras
e tornei outras mais belas.

Eu preparo uma canção
que faça acordar os homens
e adormecer as crianças.

Drummond
Ver-te. Tocar-te. Que fulgor de máscaras.
Que desenhos e rictus na tua cara
Como os frisos veementes dos tapetes antigos.
Que sombrio te tornas se repito
O sinuoso caminho que persigo: um desejo
Sem dono, um adorar-te vívido mas livre.
E que escura me faço se abocanhas de mim
Palavras e resíduos. Me vêm fomes
Agonias de grandes espessuras, embaçadas luas
Facas, tempestade. Ver-te. Tocar-te.
Cordura.
Crueldade.

Hilda Hilst

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